Socialismo
Socialismo
Socialismo é uma doutrina política e econômica que surgiu no final do século XVIII e se caracteriza pela ideia de transformação da sociedade através da distribuição equilibrada de riquezas e propriedades, diminuindo a distância entre ricos e pobres.
Noël Babeuf foi o primeiro pensador que apresentou propostas socialistas sem fundamentação teológica e utópica como alternativa política.
Karl Marx, um dos principais filósofos do movimento, afirmava que o socialismo seria alcançado a partir de uma reforma social, com luta de classes e revolução do proletariado, pois no sistema socialista não deveria haver classes sociais nem propriedade privada.
Todos os bens e propriedades particulares seriam de todas as pessoas e haveria repartição do trabalho comum e dos objetos de consumo, eliminando as diferenças econômicas entre os indivíduos.
O sistema socialista é oposto ao capitalismo, cujo sistema se baseia na propriedade privada dos meios de produção e no mercado liberal, concentrando a riqueza em poucos.
A origem do socialismo tem raízes intelectuais e surgiu como resposta aos movimentos políticos da classe trabalhadora e às críticas aos efeitos da Revolução Industrial (capitalismo industrial). Na teoria marxista, o socialismo representava a fase intermediária entre o fim do capitalismo e a implantação do comunismo.
O socialismo sugeria uma reforma gradual da sociedade capitalista, demarcando-se do comunismo, que era mais radical e defendia o fim do sistema capitalista e queda da burguesia através de uma revolução armada.
Tipos de socialismo
Socialismo utópico
A reação operária aos efeitos da Revolução Industrial fez surgir críticos ao progresso industrial que propunham reformulações sociais e a construção de uma sociedade mais justa. Os primeiros socialistas, ao formularem profundas críticas ao progresso industrial, ainda estavam impregnados de valores liberais. Atacavam os grandes proprietários, mas tinham, em geral, muita estima pelos pequenos, acreditando ser possível haver um acordo entre as classes sociais. Elaboraram soluções que não chegaram, porém, a constituir uma doutrina, e sim modelos idealizados, sendo por isso chamados de utópicos.
Um dos principais teóricos dessa fase inicial do socialismo era o conde francês Claude de Saint-Simon, que havia aderido à revolução de 1789. Um racionalista, como a maioria de seus contemporâneos, propôs, em Cartas de um habitante de Genebra (1802), a formação de uma sociedade em que não haveria ociosos (como ele considerava os militares, os religiosos, os nobres e os magistrados) nem a exploração econômica de grupos de indivíduos por outros. Propôs, ainda, a divisão da sociedade em três classes: os sábios, os proprietários e os que não tinham posses. O governo seria exercido por um conselho formado por sábios e artistas.
Outro teórico da fase inicial do socialismo foi o francês Charles Fourier, que, ao lado de Pierre Leroux, teria sido um dos primeiros a utilizar a palavra "socialismo". Filho de comerciantes, era herdeiro da ideia de Jean-Jacques Rousseau de que o homem é naturalmente bom, mas a sociedade e as instituições o pervertem. Acreditava ser possível reorganizar a sociedade a partir da criação de falanstérios, fazendas coletivas agroindustriais. Nunca conseguiu o apoio de empresários para levar o projeto adiante, apesar de alegar que os falanstérios superariam a desarmonia capitalista, surgida da divisão do trabalho e do papel anárquico exercido pelo comércio na sociedade. Após sua morte, alguns falanstérios surgiram no continente americano, como os de Réunion e da Falange Norte-americana nos Estados Unidos e o do Saí no Brasil.
A expressão "socialismo" foi consagrada por Robert Owen na anglosfera a partir de 1834. Jovem administrador de uma fábrica de algodão em Manchester, observou de perto as condições desumanas de trabalho e se revoltou com as perspectivas do desenvolvimento industrial. Defendendo a impossibilidade de se formar um ser humano superior (o "Novo Homem") no interior de um sistema egoísta e explorador como o capitalismo, buscou a criação de uma comunidade ideal, de igualdade absoluta. Na Escócia, onde assumiu o controle de algumas fábricas de algodão em New Lanark por 25 anos, Owen chegou a aplicar suas ideias, implantando uma comunidade de alto padrão, na qual as pessoas trabalhavam dez horas por dia e tinham acesso a instrução de alto nível. O sucesso da cooperativa e suas críticas à propriedade privada e à religião, no entanto, levaram Owen a abandonar a Grã-Bretanha e se refugiar nos Estados Unidos, onde fundou a comunidade de New Harmony no estado da Indiana. Após presenciar, em seu retorno ao Reino Unido, a falência de suas cooperativas, dedicou-se, no fim da vida, à organização de sindicatos.
Socialismo científico
Paralelamente às propostas do socialismo utópico, surgiu o socialismo científico, cujos teóricos propunham compreender a realidade e transformá-la mediante a análise dos mecanismos econômicos e sociais do capitalismo, constituindo, assim, uma proposta revolucionária do proletariado. Daí se origina o termo "científico", uma vez que seus teóricos se baseavam numa análise macro-histórica e filosófica da sociedade, e não apenas nos ideais de justiça social.
O maior teórico dessa corrente foi o filósofo e economista alemão Karl Marx, que contou com a contribuição do compatriota Friedrich Engels em muitas de suas obras. No Manifesto Comunista (1848), Marx e Engels esboçaram as proposições do socialismo científico, que seriam definidas de forma completa em O Capital, obra mais conhecida de Marx, que causaria uma verdadeira revolução na economia e nas ciências sociais. Entre os princípios expostos na obra, destacam-se uma interpretação socioeconômica da história, conhecida como materialismo histórico, os conceitos de luta de classes, de mais-valia e de revolução socialista.
Segundo o materialismo histórico, toda sociedade é determinada, em última instância, por suas condições socioeconômicas, chamadas de "infra" e "superestrutura". Adaptadas a ela, as instituições, a política, a ideologia e a cultura como um todo compõem o que Marx chamou de "infraestrutura e superestrutura". Um exemplo claro da relação entre essas estruturas é a Revolução Francesa: naquele momento, era necessário transformar a ultrapassada ordem político-jurídica do Antigo Regime (a "superestrutura") para manter a "infraestrutura" vigente.
Para Karl Kautsky, teórico marxista e um dos fundadores da social-democracia, a sociedade sempre é mais forte que a natureza humana ("natureza humana" entendida por ele como sendo o indivíduo). Segundo Kautsky: "mas se o socialismo é uma necessidade social, então, se entrasse em conflito com a natureza humana, esta seria a derrotada, e não o socialismo."
A luta de classes, na análise marxista, é o agente capaz de transformar a sociedade. O antagonismo entre dominadores e dominados induz às lutas e às transformações sociais. Em termos sociais, se trata do motor da história humana, só terminando com o aparecimento da sociedade comunista perfeita, onde desapareceriam a exploração de classes e as injustiças sociais. Já o conceito de mais-valia corresponde ao valor não remunerado do trabalho do operário, que é apropriado pelos capitalistas.
Contra a ordem estabelecida pela sociedade burguesa, Marx considerava inevitável a ação política do operariado organizado, a revolução socialista, que iria inaugurar a construção de uma nova sociedade. Num primeiro momento, o controle do Estado ficaria na mão da ditadura do proletariado, quando ocorreria a socialização dos meios de produção através da eliminação da propriedade privada. Numa etapa posterior, a meta seria o comunismo perfeito, onde todas as desigualdades sociais e econômicas, além do próprio Estado, acabariam.
Anarquismo
Pierre-Joseph Proudhon, primeiro anarquista autoproclamado do mundo.
Outra corrente socialista surgida no século XIX foi o anarquismo. Pregava a supressão de toda e qualquer forma de governo, defendendo a liberdade de forma geral. O principal precursor desta doutrina é Pierre-Joseph Proudhon, que se vale dos pressupostos do socialismo utópico (sendo considerado um socialista utópico por alguns historiadores) para criticar os abusos do capitalismo em sua obra O que é a propriedade? (1840). Respeita a pequena propriedade e propõe a criação de cooperativas e de bancos que concedessem empréstimos a juros zero aos empreendimentos produtivos, além de crédito gratuito aos trabalhadores. Proudhon foi o primeiro anarquista autoproclamado, apesar de ser considerado um socialista utópico pelos marxistas, rótulo que jamais aceitou.
Ao propor a criação de uma sociedade sem classes, sem exploração, sem Estado, formada por homens livres e iguais, Proudhon inaugurou o anarquismo. Ele propunha a destruição dos Estados nacionais e sua substituição pelas "repúblicas de pequenos proprietários". Suas propostas inspiraram, principalmente, o teórico russo Mikhail Bakunin, que se tornou líder do chamado "anarquismo terrorista". Defendia que a violência era a única forma de se alcançar uma sociedade livre de Estados e de desigualdades, um mundo de felicidades e liberdades para os operários.
O anarquismo, também conhecido como "comunismo libertário", e o socialismo científico de Marx coincidem quanto ao objetivo final: atingir o comunismo, estágio em que não existem mais divisões de classes, exploração, e nem mesmo o Estado. Entretanto, para os marxistas, antes dessa meta, faz-se necessária uma fase intermediária, a ditadura do proletariado. Já na concepção dos anarquistas, as classes, as instituições e as tradições devem ser erradicadas imediatamente, tendo, como finalidade, a aniquilação do Estado. As críticas mútuas entre anarquistas e marxistas levaram a uma convivência de choques e divergências, comprovada pelas rivalidades que ocorreram posteriormente nos países onde ambas as facções coexistiram na luta contra a ordem estabelecida, tais como na Rússia após a Revolução e na Espanha durante a Guerra Civil.
Socialismo cristão
Durante a Revolução Industrial, uma série de teóricos cristãos, como Robert Lamennais, Adolph Wagner e J. D. Maurice, entre outros, lançaram apelos às classes dominantes para que aliviassem os sofrimentos das classes trabalhadoras. Nasceu, dessa forma, o socialismo cristão, uma tentativa de aplicar os ensinamentos de Cristo sobre amor e de respeito ao próximo aos problemas sociais gerados pela industrialização. A grande mobilização operária levou a cúpula da Igreja Católica a definir oficialmente seu papel nos novos problemas sociais.
Em 1891, o papa Leão XIII lançou a encíclica Rerum Novarum, em que expunha o pensamento social do catolicismo. Nela, reavivava o papel da Igreja como instrumento de reforma e justiça social. Reconhecia o direito à propriedade privada e rejeitava o fortemente socialismo científico ateu de Marx, mas condenava a ganância capitalista e a exploração desumana da força de trabalho. O papa propunha que os empregadores reconhecessem os direitos fundamentais dos proletários, como a limitação da jornada de trabalho, o descanso aos fins de semana, o estabelecimento de salários dignos, as férias remuneradas, entre outros. A encíclica recomendava também a intervenção do Estado no mercado privado a fim de melhorar as condições de vida dos trabalhadores nos setores da habitação e da saúde.
Após a publicação dessa encíclica, a Igreja não mais se desligou da questão social e de suas concepções políticas, caráter reforçado sobretudo após o concílio Vaticano II (1962-1965).
É comum confundirem a expressão "socialismo cristão", uma teoria política com cunho cristão, baseada na igualdade dos homens perante Deus, com a visão da Igreja Católica sobre o aspecto social e político dos povos (Doutrina Social da Igreja).